por Inajá Martins de Almeida
- Você precisa ter fome.
Estanquei. Passei a inquirir o sentido da fome. Percebi que só
caminhamos quando as necessidades nos forçam a sair da área de conforto.
Olhei para dentro de mim. Acompanhei minha trajetória através da
linha do tempo. Entre linhas e rabiscos, chuleei a jovem na capital paulista,
recém formada, desempregada, mas dona de um sonho maior do que aquela
imensidão, emaranhado de pessoas que iam e vinham no burburinho das alamedas
ruas e avenidas, todas abertas a conduzirem os sonhos da jovem. Janelas que se
abriam aos horizontes infindáveis dos que sonham e buscam se realizarem através
deles.
Lembrei-me de José, sim, o personagem que provocara a ira dos irmãos. Era a capa colorida que os ofuscava, mas, acima de tudo eram os sonhos que os perturbavam. E percebi que...
Era o sonho que movia o olhar inquieto. A mente a trabalhar em
compassos alterados, enquanto gravitava em busca da realidade do sonho, o sonho
realizável. Da realidade, o sonho real.
Sonho... Dias após a fome me levaria a desvendar a existência de
duas pessoas apenas: as que sonham e as que estão mortas. Logo formado estava o
triângulo: - a fome, o sonho e a sonhadora.
E volto a José... Imagino noites e dias naquele poço fundo, sem água, alimento - era a fome que abatia seu corpo, mas o sonho do sonhador o alimentava, ao ponto de ser visto pelos que passavam e ouviam seus gritos inflamados.
E José fora levado como escravo e faraó dele se apiedou e o tornou seu administrador...
A jovem sonhadora cedera lugar a jovem sexagenária, mas cheia de
sonhos. Sentia-se viva, ainda mais diante das lembranças. Os sonhos que se
transformaram. Sonhos realizados. Sonhos abafados. Sonhos sonhados. Mas...
Sonhos.
Era eu a jovem que trazia na bagagem, muitos sonhos.
Sou eu a
sexagenária, que não perdeu os sonhos, ainda que muitos sonhos se
ajam perdidos pelos caminhos...
Sonhos de sonhadores... Sonhos de Josés...
Fora esta a impressão que me veio aos sentido, quando assistia um treinamento do psiquiatra, escritor e
palestrante Roberto Shinyashiki, e me deparei com uma fala que me tocou
fundo:
- Você precisa ter fome.
Esta fome eu tenho.
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