terça-feira, 1 de maio de 2018

QUAL A NOSSA FOME?

por Inajá Martins de Almeida

- Você precisa ter fome.

Estanquei. Passei a inquirir o sentido da fome. Percebi que só caminhamos quando as necessidades nos forçam a sair da área de conforto.

Olhei para dentro de mim. Acompanhei minha trajetória através da linha do tempo. Entre linhas e rabiscos, chuleei a jovem na capital paulista, recém formada, desempregada, mas dona de um sonho maior do que aquela imensidão, emaranhado de pessoas que iam e vinham no burburinho das alamedas ruas e avenidas, todas abertas a conduzirem os sonhos da jovem. Janelas que se abriam aos horizontes infindáveis dos que sonham e buscam se realizarem através deles.

Lembrei-me de José, sim, o personagem que provocara a ira dos irmãos. Era a capa colorida que os ofuscava, mas, acima de tudo eram os sonhos que os perturbavam. E percebi que...  

Era o sonho que movia o olhar inquieto. A mente a trabalhar em compassos alterados, enquanto gravitava em busca da realidade do sonho, o sonho realizável. Da realidade, o sonho real.

Sonho... Dias após a fome me levaria a desvendar a existência de duas pessoas apenas: as que sonham e as que estão mortas. Logo formado estava o triângulo: - a fome, o sonho e a sonhadora.

E volto a José... Imagino noites e dias naquele poço fundo, sem água, alimento - era a fome que abatia seu corpo, mas o sonho do sonhador o alimentava, ao ponto de ser visto pelos que passavam e ouviam seus gritos inflamados. 

E José fora levado como escravo e faraó dele se apiedou e o tornou seu administrador...

A jovem sonhadora cedera lugar a jovem sexagenária, mas cheia de sonhos. Sentia-se viva, ainda mais diante das lembranças. Os sonhos que se transformaram. Sonhos realizados. Sonhos abafados. Sonhos sonhados. Mas... Sonhos.       
  
Era eu a jovem que trazia na bagagem, muitos sonhos. 

Sou eu a sexagenária, que  não perdeu os sonhos, ainda  que muitos sonhos se ajam perdidos pelos caminhos...

Sonhos de sonhadores... Sonhos de Josés...


Fora esta a impressão que me veio aos sentido, quando assistia um treinamento do psiquiatra, escritor e palestrante Roberto Shinyashiki, e me deparei com uma fala que me tocou fundo:

- Você precisa ter fome.

Esta fome eu tenho. 


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