por Inajá Martins de Almeida
Poderia ter sido uma manhã como tantas outras – um quarto,
uma cama quentinha, um cafezinho servido a bom gosto, livros a cabeceira; em
mãos apontamentos vários – mas não o fora.
Poderia ter sido o local dos meus devaneios matinais, mas
não o fora.
De repente... Tudo me era novo: corredores imensos, paredes brancas,
faixas, de um marrom claro contrastando, a quebrar aquele imenso gelo de paredes. No chão, faixas coloridas – azul, verde, vermelha – apontavam direções
e caminhos.
Pessoas circulavam – cadeiras de rodas, macas, equipamentos
diversos; passos firmes, compassados, cada qual a seu ritmo, numa melodia
harmoniosa coloriam, vibravam no espaço em tons que brilhavam e espargiam no ar.
Olhares cruzavam-se – sombrios, vagos, temerosos alguns; alegres,
esperançosos outros mais.
Eis que, a um canto, sentada em pensamentos um caminhar me
faz acompanhar aquela dança que, calmamente era executada por passos retos,
firmes, seguros de si, num andamento que mais parecia uma marcha em desfile
cívico.
Na sala, aquele que me trouxera até este local, aguardava a
outras baterias de exames, a que nos últimos meses se vira obrigado a fazer.
Uma silhueta de mulher, esguia em seu pijama azul de
algodão, echarpe preto com frisos brilhantes adornava-lhe o dorso, cobria parte
de suas costas, terminando por um singelo nó, bem aprumado no colo. Um turbante
colorido escondia a queda dos cabelos; um par de brincos iluminava aquele rosto
que se tingia de rosa, iluminava os lábios que sorriam e fazia saltar àqueles
olhos que espargiam alegria em agradecimento a vida. Era a elegância, a figura
de mulher elegante, como pouca, a desfilar naquele corredor, agora improvisado
em passarela, aos olhos atentos de quem pode observar cena ímpar.
Quis esboçar, em palavras, meus pensamentos, mas... Retraí-me,
envergonhei-me e calei e apenas pude expressar um breve bom dia, deixando
seguir aquele ser esguio que tanto me impressionou a postura.
Agora, ao cair da tarde a praça da rodoviária, um banco de
cimento, árvores ao redor, poucas pessoas podem ser testemunhas destas linhas
que acompanham o retorno a casa.
Lembranças daqueles brancos corredores, daquelas rampas que
se alongavam entre declives e aclives, fazem-me companhia. Um quarto repleto de
aparelhagem. Corpos inertes. Ali aquele que tanto me corresponde aos anseios,
aquele que durante tantos anos me tem significado o sentido da vida, clama pela
saúde que se debilita ao questionar indolente da doença que luta entre vírus interiores.
Agora são as linhas que me encontram e, ao mesmo tempo em
que se escrevem ao me escrever, almejam o próximo reencontro, sempre uma
caixinha de surpresa, ante os acontecimentos em que os minutos, que não tem
pressa em se apressar, tornam-se mutantes, no mesmo patamar das lutas que se
travam entre corpos interiores e equipe externa que não se rende aos fatos.
E, como há pouco pude me alegrar aos ouvir – “você não
desiste nunca”, posso também almejar que, o mesmo bom senso que me soube
expressar, compreenda que o não desistir faz parte da caminhada, tendo
expressivo significado para a conclusão dos acontecimentos que se desenrolam.
Que realmente, não há como desistir, quando se tem a certeza
de que “o choro pode durar uma noite, mas a alegria vem com a manhã" como nos ensinou o apóstolo Paulo.
2 comentários:
Emocionada aqui.....
Sim, querida Irene. O tempo se faz testemunha da emoção deixada daquele momento. Agora, o teu emocionada, também pode me emocionar, ao retomar ao texto, à cena da elegância, à palavra que ecoa em meus silêncios diários. Realmente não há como desistir. A vida clama por vida - vida que pode se renovar a cada momento, enquanto temos vida. Momento de renovar encontros. Momentos de rememoriar cenas. Momentos inesquecíveis que sempre requerem novas linhas, e aqui estou eu. Num sábado, 18/09/2018, partia aquele que me deixou o significado de uma palavra - você não desiste nunca. E aqui estou a continuar sempre, porque o desistir, jamais.
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